A POESIA CHINESA REIMAGINADA POR CAMILO PESSANHA
Camilo Pessanha lecionou filosofia no
liceu de Macau, então colônia portuguesa, onde escreveu ensaios sobre a
história, civilização e artes do Império do Meio, colecionou objetos de arte –
pinturas, esculturas, caligrafias, cerâmicas, peças de bronze, bordados,
joalheria, indumentária –, organizou o primeiro manual que se conhece
para aprender chinês: Kuok Man Fo Shu –
Leituras chinesas, redigido em colaboração com José Vicente Jorge, e publicou traduções de oito elegias da época da dinastia
Ming, valendo-se de seu conhecimento do idioma chinês – conhecia nada menos que
3.500 caracteres ideográficos. Em carta de 1912 endereçada a Carlos Amaro, o
poeta português escreve: “Bem desejaria publicar um dia meia dúzia de pequenas
traduções, mas a empresa, a ser a coisa como eu a tenho esboçado, é cheia de
dificuldades[1]”.
Considerado as características da língua chinesa — “monossilábica, escrita sem
modulações gramaticais, apenas uma morfologia posicional, com entonações
musicais, que servem para diferenciar muitas sílabas que são idênticas[2]”
e a forma concentrada da quadra tradicional chinesa (絕句, jueju, forma poética dividida em dois
dísticos, com métrica de heptassílabos),
o poeta escolheu realizar versões literais, quase todas em oito versos,
distribuídos em duas estrofes, sem regularidade métrica ou rímica, predominando
os versos de doze, treze ou catorze sílabas. Na introdução que escreveu para as
suas Oito elegias chinesas,
publicadas inicialmente no jornal O
progresso, de Macau, o poeta escreve:
Traduzi
literalmente – tanto quanto a radical diferença entre o gênio das duas línguas
o permite. Esforcei-me por não suprimir nenhuma das ideias contidas no
original, por adjetiva e acessória que fosse – embora tendo por vezes de
sacrificar a essa imposição de fidelidade os longes de ritmo e a relativa
simetria da forma que eu desejaria dar à tradução de cada quadra chinesa, na
impossibilidade de as traduzir em quadras de versos portugueses. Menos ainda
acrescentei fosse o que fosse no intuito de revelar pormenores, ou com a
preocupação de falsos exotismos. Isolei a tradução de cada um dos versos, e
dentro dela conservei, nos limites do possível, às ideias e símbolos a ordem
original. Isto é, da poesia chinesa busquei trasladar com exatidão o que era
trasladável – o elemento substantivo ou imaginativo –; porquanto o elemento
sensorial ou musical, resultando de uma técnica métrica especialíssima (em que
há sabiamente aproveitados recursos prosódicos de que as línguas europeias não
dispõem), é absolutamente inconversível[3].
Podemos aqui estabelecer um breve
paralelo entre os métodos tradutórios de Wenceslau de Moraes e de Camilo
Pessanha: enquanto o primeiro recriava os haiku
japoneses, acrescentando, muitas vezes, informações ausentes no texto de
partida, para realçar a paisagem e o clima emocional de cada composição, Camilo
Pessanha escolhe outro caminho tradutório, buscando a máxima fidelidade ao
sentido original, mesmo que ao custo de fazer suas versões em linhas que se
aproximam da prosa. O autor de Clepsidra
submetia cada uma de suas traduções à revisão crítica de um eminente sinólogo,
o já referido José Vicente Jorge, que, conforme testemunha o poeta, “não
só me fez o favor de emendar em alguns pontos a tradução, aproximando-a mais da
intenção original, mas forneceu-me ainda, espontaneamente, grande cópia de
notas elucidativas[4]”, que
acompanham os poemas recriados. Pessanha valoriza a intervenção crítica do
sinólogo, apontando que, sem essas notas, “a inteligência dos textos (mesmo sob
o ponto de vista estético) ficaria deficiente[5]”.
A importância da literalidade na poesia chinesa, do
ponto de vista de Pessanha, reside no “gosto exagerado pela alusão histórica ou
literária, que faz com que numerosas passagens, e até poemas inteiros, tenham
duplo sentido – um superficial e direto e o outro referido ou simbólico,
erudito e profundo[6]”.
Portanto, conclui o poeta, “em tais condições, o tradutor que não esteja
aparelhado com uma vasta cultura sinológica, navega em permanente risco de
soçobrar de encontro a inevitáveis, traiçoeiros cachopos[7]”.
A compreensão do sentido literal, colocado em primeiro plano em suas traduções,
não significa que o autor desconhecia ou menosprezava a extrema poeticidade
inerente à escrita ideográfica, bem ao contrário: o poeta português faz
referência à “singularidade estrutural” dessa linguagem altamente concentrada,
ao “grande poder de evocação visual” e ao “intrínsico valor estético desses
caracteres”, cada um dos quais “é fundamentalmente um desenho estilizado do
mais puro gosto e do melhor efeito decorativo[8]”.
Pessanha menciona ainda a “euritmia musical da frase escrita, na sua
transliteração prosódica, que, pela sábia valorização dos tons, é mais rica,
mais expressiva e mais perfeita na literatura chinesa do que o de nenhuma
métrica europeia”[9]. Sua
ênfase na versão literal, portanto, radica numa hipótese de impossibilidade de
recuperação das qualidades estéticas da escrita chinesa em línguas ocidentais.
Escrevendo sobre esse idioma estrangeiro, tão
radicalmente outro, Pessanha destaca o seu caráter tonal, que considera “um
elemento prosódico” de “alto valor oratório e poético[10]”,
a “imprecisão da linguagem, que no chinês literário é qualidade fundamental,
chegando as palavras a não ter significado próprio – tão divergentes e, até,
opostas são as acepções de cada uma[11]” e
ainda a “falta de leis sintáxicas que presidam à sua estrutura[12]”,
tornando uma frase suscetível a “interpretações mais contraditórias[13]”.
Ressalta ainda “a concisão epigráfica – ou, se o leitor assim quiser,
telegráfica[14]”, que
“manda suprimir quase completamente as palavras designativas das relações
lógicas”, exigindo do leitor ocidental um esforço imaginativo para a
interpretação — “e essa intensidade de sugestão é um dos intraduzíveis encantos
da poesia chinesa[15]”.
Considerando todas essas dificuldades, Pessanha não intenta uma reengenharia
estrutural da poesia chinesa no idioma português, nem utiliza os padrões da
versificação portuguesa, optando pelo verso livre, quase em prosa narrativa.
Vestindo a máscara dramática de um poeta da dinastia Ming, o autor de Clepsidra “não reproduz nem o
paralelismo do poema chinês, nem o assindetismo da sintaxe chinesa (que,
inclusive, diga-se de passagem, caracterizam alguns dos seus poemas de
maturidade, como Imagens que passais pela retina e Foi um dia de inúteis agonias, entre
outros)”, escreve Paulo Franchetti[16].
“A leitura da tradução mostra mesmo um movimento contrário”, prossegue o
ensaísta brasileiro: “a suspensão do pensamento é expressa por reticências e é
evidente a preocupação em coordenar as frases e manter uma sintaxe desprovida
de grandes sustos[17]”.
A
estratégia tradutória assumida por Pessanha, desse modo, revela-se fiel ao
programa expresso no texto de introdução que escreveu para as Oito elegias chinesas, no qual “o poeta
recusa o exotismo fácil que resultaria da imitação do arranjo sintático chinês,
bem como da crueza imagética que resultaria de uma tradução muito colada ao
original[18]”. Ao
mesmo tempo, o poeta “dá especial atenção ao jogo das ideias e à ordem em que
elas aparecem, ou seja, à modulação sentimental que resulta da sua apresentação
numa dada sequência[19]”.
Como exemplo da poética da tradução de Pessanha,
transcrevemos abaixo sua versão da terceira elegia – a mais concisa do conjunto e dedicada a Wenceslau de
Moraes[20]:
SOBRE O TERRAÇO
(A Wenceslau
de Moraes)
Os antigos
mortos, invisivelmente
Vêm ainda ao
seu terraço antigo...
Já sopra da
nona lua o vento lamentoso.
De os três rios[21]
devem estar a chegar os gansos da arribação.
Cobrem nuvens
a vastidão dos dois Kuangs[22].
Declina,
pálido, o sol, sobre Pang-Lai[23].
Desterrado da
pátria e sem notícias dela,
Para essas
bandas volvo de contínuo os olhos[24].
A quadra chinesa é aqui
reinventada em dois quartetos, sem medidas métricas ou rimas; o ritmo
aproxima-se ao da prosa e o enjambement
é empregado nos dois primeiros versos e nos dois últimos. Neste poema, assim
como nas demais peças da série, Pessanha mantém palavras em chinês – nomes de
rios, pássaros, montanhas, mosteiros – num deliberado hibridismo que enriquece
a sonoridade dos versos. As mudanças súbitas de paisagem (o terraço dos mortos
/ o vento / os rios e gansos / o sol sobre Pang Lai) aproximam-se das técnicas
de montagem da poesia chinesa e japonesa, propiciadas pela própria estrutura do
ideograma, e representam, metaforicamente, o estado emocional do autor do
poema, que nas duas últimas linhas lamenta a condição do exílio e o afastamento
da mulher amada. É inevitável pensarmos
aqui na biografia de Pessanha, em seu desencontro amoroso com Ana de Castro
Osório e no exílio voluntário em
Macau. A tradução poética pode ser pensada nesse caso como
heteronímia ou máscara poética poundiana, em que Pessanha usa a persona de um poeta chinês da Dinastia
Ming para expressar sua subjetividade – hipótese formulada por Paulo
Franchetti, para quem “a escolha de Camilo Pessanha deve-se provavelmente ao
fato de estes poemas espelharem os mesmos traços da sua vivência: solidão,
exílio, fuga a um mundo real insuportável e nostalgia da pátria abandonada[25]”,
ao que podemos acrescentar a afinidade filosófica do poeta português com a
visada “ao mesmo tempo niilista e estoica[26]”
dessas oito composições.
Devemos assinalar também a
presença, nas traduções de Pessanha, de características de sua própria poética,
como a musicalidade, as imagens concisas, a alternância de nasais e sibilantes
(como acontece nas rimas do poema Viola
chinesa), os jogos de aliterações e assonâncias, o elemento sobrenatural
(“Os antigos mortos, invisivelmente”), o tom enigmático, a temática do fluir
temporal e a relação analógica entre os planos objetivo e subjetivo,
característica da poesia chinesa tradicional. No prefácio que escreveu para
esse conjunto de poemas, Pessanha ressalta a unidade existente entre as peças,
“tão parecidas na métrica – de um andamento calmo e dolente[27]”
e “tão homogêneas no vibrar de uma idêntica emoção – amorosa e grave[28]”,
culminando na “predileção de imagens análogas e no vigoroso e rápido
processo de as evocar – que, à sua leitura, no próprio original chinês, se
acredita serem produção de um mesmo espírito e fragmentos de uma obra única
sistematizada[29]”.
Uma
questão que merece ser discutida com cuidado é o da seleção dos poemas chineses
traduzidos por Pessanha. A terceira elegia, que comentamos há pouco, é uma
composição de autoria do obscuro Wang Ting Hsiang, não pertence ao Livro das Odes ou dos Cantares[30]
coletados por Confúcio no século VI a.C. nem ao período áureo da poesia chinesa
– a Dinastia T’ang[31] (618-907), em que destacaram autores como Li
T’ai Po, Wang Wei e Tu Fu –, mas à Dinastia Ming (1368-1644), célebre pela sua
porcelana, engenharia e arquitetura (datam desse período a conclusão da Grande
Muralha e a construção da Cidade Proibida). Pessanha justifica a escolha destes
oito poemas de celebração da natureza, da solidão, do exílio e da morte no
prefácio que escreveu para as suas traduções, onde afirma: “começarei por uma
minúscula antologia de dezessete[32]
elegias da dinastia Ming – elegias pelo acento de dolorida melancolia que a
todas domina, porquanto a forma, incisiva e curta, é a de verdadeiros epigramas”,
escolhidas “de entre os inúmeros e vastos cancioneiros da referida época, por
um dos mais delicados estetas do Império do Meio nos princípios do século XIX,
para presente de despedida a um amigo íntimo que para longe se ausentava[33]”.
O compilador dessas composições, escreve Pessanha, “foi o ministro Iong Fong
Kong, que ao tempo (no reinado de Chia-King) exercia em Pequim os mais elevados
cargos do estado, inclusive o de mentor do príncipe herdeiro[34]”.
Tais poemas chegaram a suas mãos “trazidas de tão longe como relíquia preciosa
– adaptadas a álbum (com capa de rica madeira das Filipinas, em que havia
esculpido o nome em um breve elogio do Mestre),
e encerrado tudo em um estojo de tamarindo de dupla tampa[35]”.
Na dedicatória ao conjunto de poemas, prossegue, “se declara que os versos são
do tempo dos Ming. Nenhuma informação acerca do autor ou autores, senão que
viveram nesse período (1368 a
1628)[36]”. A identificação da autoria de cada composição
foi possível graças “à direção de um letrado chinês[37]”,
e, a partir das indicações fornecidas por ele, Pessanha nomeou, nas notas, a
autoria de cada peça. Por qual motivo esta coleção de poemas chamou a atenção
de Pessanha, mais do que as peças líricas de um Li T’ai Po, considerado o maior
poeta da China? Não temos nenhum registro do autor – carta, ensaio ou resumo de
conferência – que permita chegarmos a uma conclusão definitiva, e é bastante
provável que sua obra tradutória, em grande parte, tenha sido perdida. Uma hipótese formulada por Paulo Franchetti é
que o poeta teria escolhido composições da Dinastia Ming exatamente por serem “poemas inéditos em línguas ocidentais, produzidos não por
luminares da poesia chinesa, mas por autores menos divulgados e apreciados pelo
público[38]”.
A seleção feita pelo autor da Clepsidra,
prossegue o autor brasileiro, “deveria ser suficiente para sugerir, mesmo aos
menos atentos, a amplitude de referências chinesas do poeta, bem como para
indicar o seu grau de conhecimento do idioma, pois não pode apoiar-se em
traduções para outras línguas ocidentais[39]”.
A morte prematura do poeta,
aos 59 anos, bem como o extravio de parte de seus papeis, não nos permitem
saber qual era exatamente o seu projeto tradutório, se intencionava traduzir
também excertos do Livro dos Cantares
e outras joias de uma literatura milenar, ou se a sua seleção fora
principalmente temática, por afinidade com a sua própria poesia, à maneira da
heteronímia. Este é um problema que poderá talvez ser elucidado em anos
vindouros, caso venham à luz obras extraviadas de um autor de memória
prodigiosa, incansável curiosidade intelectual e rara sensibilidade para a
compressão de uma cultura tão distante da sua. Fato indiscutível é o
conhecimento que o autor tinha dos clássicos da literatura chinesa, tema
inclusive de uma conferência pronunciada por ele em Macau, cujo resumo foi
publicado em 21 de março de 1915 no jornal O
progresso, onde afirma:
Confúcio foi
principalmente um compilador. O conferente expôs resumidamente o objeto dos
livros de Confúcio, um por um, mostrando como neles se encontram os antigos
cantos, as antigas lendas, a velha história, as velhas leis, os velhos ritos e
a velha moral do povo chinês. A propósito do Livro das Transformações, anotado por Confúcio e já velho de mais
de mil anos quando foi anotado, deu o conferente uma ideia da antiga concepção
chinesa, dualista, do Universo, e dos dois símbolos pelos quais essa concepção
é ordinariamente representada: o ma-li-u
e os oito kua – de que o conferente
fez o esboço no quadro preto, e explicou o sentido[40].
Além das Oito
elegias chinesas, Pessanha legou-nos os artigos, ensaios e resumos de
conferências que tiveram publicação póstuma, sob o título de Escritos sobre a civilização chinesa,
principal fonte de informação para o presente texto.
O profundo interesse[41]
e respeito de Pessanha por uma tradição poética radicalmente diferente da
europeia e o desejo de relacionar-se com ela por meio da tradução e da reflexão
crítica terão desdobramentos em sua própria poesia, especialmente nos três
poemas de Clepsidra que dialogam, de
modo bastante tênue, com as paisagens e referências culturais do país de
Confúcio e Lao Tzu: Viola chinesa,
que apesar do título tem uma arquitetura poética mais próxima ao engenho
barroco, pelo jogo lúdico das rimas e permutação de palavras-chave entre as
estrofes; Ao longe os barcos de flores,
em que a agudeza seiscentista predomina sobre a simplicidade, com a repetição
da linha “Só, incessante, um som de flauta chora...[42]”
entre as três estrofes; e sobretudo Desejos,
onde lemos, nas linhas finais: “Como os ébrios chineses delirantes / Aspiram,
já dormindo, o fumo quieto / Que o seu longo cachimbo predileto / No ambiente
espalhava pouco antes...[43]”.
Nesta composição, ao contrário das duas anteriores, o cenário descrito na
última estrofe é quase fotográfico, com o close
em um referente concreto, substantivo – o cachimbo utilizado no consumo do
ópio, hábito adquirido pelo próprio Pessanha em sua estada em Macau. Diálogo mais
explícito com a poesia chinesa parece ocorrer no poema de abertura de Clepsidra, composto de apenas quatro
versos – assim como a quadra tradicional chinesa: “Eu vi a luz em um país
perdido. / A minha alma é lânguida e inerme. / Oh! Quem pudesse deslizar sem
ruído! / No chão sumir-se, como faz um verme[44]”.
A concisão e os cortes sintáticos desta peça altamente concentrada, assim como
a referência ao “país perdido”, parecem sinalizar ecos de Cathay, ainda que o
tom melancólico e o desejo de extinção remetam antes à filosofia de
Schopenhauer, autor de importância decisiva na formação intelectual de Pessanha
(recordemos aqui a afirmação do poeta português em carta a José Benedito
Pessanha, a respeito da organização temática de Clepsidra: Dividi-lo-ia em duas partes. A primeira havia de ser a
luta pela realização do prazer, com a certeza de lutar por uma aspiração falsa.
Seria talvez pessimista: o prazer, não tendo realidade sua, era o aniquilamento
do desejo, de forma que esta luta representaria ansiar a morte[45]”).
O jogo de claro-escuro que se estabelece no texto (“Eu vi a luz em um país
perdido” / “No chão sumir-se, como faz um verme”), por outro lado, é novamente
um recurso barroco, apropriado pelo leitor fino que foi Camilo Pessanha, para
quem a descoberta da China – ao contrário do que aconteceu com Pound – não teve
impacto radical em seu método de criação poética. Conforme escreve Paulo Franchetti, “o mais
adequado, no caso das relações entre a poesia de Pessanha e a poesia chinesa
(...) não é pensar em influência, mas em reconhecimento, em descoberta de
similaridades[46]”,
em especial a riqueza imagética, a sonoridade e o caráter sugestivo das linhas
– elementos da estética simbolista –, que solicitam a participação imaginativa
do leitor para sua decodificação. Pessanha, leitor da poesia chinesa,
intérprete da cultura do Império do Sol Nascente, nunca deixou de ser
ele-mesmo: um poeta-palimpsesto, onde encontramos ecos e ressonâncias do
barroco, do simbolismo, de misticismos do Oriente e do Ocidente, que tanto
fascinariam os poetas portugueses da geração de Orpheu, sobretudo Fernando Pessoa e Mário de Sá-Carneiro.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
LEMINSKI, Paulo. Bashô, a lágrima do peixe. São Paulo:
Brasiliense, 1983.
PESSANHA, Camilo: China: estudos e traduções. Lisboa: Vega
1983.
________: Clepsidra. São Paulo: Ateliê Editorial,
2009.
[2] Donald
Keene, citado in LEMINSKI, 1983: 33.
[4] Idem,
77.
[5] Idem.
[6] Idem.
[7] Idem.
[8] Idem,
59-60.
[9] Idem.
[10] Idem,
14.
[11] Idem,
77.
[12] Idem.
[13] Idem.
[14] Idem.
[15] Idem,
78.
[16] PESSANHA,
2009: 38.
[17] Idem.
[18] Idem.
[19]
Idem.
[20] Camilo
Pessanha e Wenceslau de Moraes se conheceram em Macau, onde o autor de Relance da alma japonesa se estabeleceu em 1885, para exercer o cargo de professor no liceu. A possível
correspondência entre os dois escritores, infelizmente, se perdeu, conforme
escreve Daniel Pires no prefácio ao volume Correspondência,
dedicatórias e outros textos, de Camilo Pessanha, publicado em 2013, que reúne
19 cartas do poeta português. Além das dedicatórias que o poeta português
oferece a Wenceslau de Moraes na terceira elegia e no poema Viola chinesa,
que integra Clepsidra, há uma breve menção ao escritor no artigo Macau
e a gruta de Camões, que Pessanha publica no jornal A Pátria, em 7
de junho de 1924: “Notáveis prosadores (basta lembrar, dentre os
contemporâneos, Lafcádio Hearn, Wenceslau de Moraes e Pierre Loti) têm
celebrado condignamente os encantos dos países exóticos” (PESSANHA: 1993, 122).
Em sua edição da Clepsidra publicada em 2009 pela Ateliê Editorial,
Paulo Franchetti inclui, na página 135 do volume, uma rara fotografia que
registra o encontro de Wenceslau de Moraes com Camilo Pessanha em Hong Kong , em 1895.
[21] O
poeta se refere ao rio Hiang-tsz-kiang e aos seus dois afluentes.
[22]
Referência ao Kuang-Tung e o Kung-Hsi atuais.
[23]
P’ang-Lai-Hsian-Kuan, mosteiro taoísta situado a oeste do Cantão. P’ang-Lai – as sarças revoltas – é o
nome de três ilhas da mitologia chinesa habitadas pelos Imortais, ou santos
taoístas.
[24]
Idem, 85.
[27] Idem.
[28] Idem.
[29] Idem.
[30] Existe uma tradução integral do Livro dos Cantares realizada pelo jesuíta português Joaquim A. Guerra,
publicada em 1979, em Macau, na coleção Clássicos
chineses.
[31]
No Brasil, foi publicada a Antologia da
poesia clássica chinesa – Dinastia T’ang – com organização e tradução de
Ricardo Portugal (São Paulo: Unesp, 2012).
[32] O número total de poemas chineses traduzidos por
Pessanha é desconhecido, já que boa parte extraviou-se. No texto de
apresentação que escreveu para as suas traduções, em 1914, o poeta declara:
“Satisfazendo uma antiga dívida para com o ilustre diretor de O Progresso, entrego hoje ao mesmo
semanário umas poucas dúzias de pequenas composições chinesas com cuja
decifração tenho entretido os ócios dos últimos seis anos de residência em
Macau” (PESSANHA: 2009, 33). Em seguida, afirma que o início dessas publicações
seria um conjunto de dezessete elegias, das quais conhecemos apenas oito,
publicadas no referido jornal.
[33] Idem,
75.
[34] Idem.
[35] Idem.
[36] Idem.
[37] Idem.
[39] Idem.
[40] Idem,
57.
[41]
Camilo Pessanha, em seus textos em prosa sobre a cultura e civilização
chinesas, nem sempre adota a mesma postura ética e metodológica, resvalando,
por vezes, em preconceitos eurocêntricos: considera a arte chinesa “apenas
decorativa ou de aplicação. A sua escultura não é estátua: é ícono, ou alfaia,
ou bibelot. A sua pintura é mera
decoração mural” (idem, 14-15). Segundo avaliação do poeta português, “é
pasmosa a ignorância que esses artistas têm da anatomia humana e da dos animais
superiores” (idem). Tais incompreensões, porém, pouco afetaram o diálogo
poético que estabeleceu com a lírica chinesa, tema específico abordado em nosso
trabalho. Uma avaliação crítica do conjunto de ideias apresentadas por Camilo
Pessanha sobre a história e a cultura da China merecerá, em nossa opinião, um
ensaio futuro, enriquecido pela discussão detalhada de suas cartas, resumos de
conferências e outros textos em prosa.
[42]
PESSANHA, 2009: 87.
[43] Idem,
55.
[44] Idem,
53.
[45]
PESSANHA, 2009: 13.
Comentários
Postar um comentário