Postagens

Mostrando postagens de setembro, 2020

DOIS POEMAS DE MAURÍCIO SIMIONATO

Imagem
  ESPOROS Ferida de gente. Feita de coisas que nos tocam, agarra-se naquilo que nos salva. Quando saiu ao sol, deitou-se ao nosso lado  sem trazer respostas. Veio como esporos ao vento. E se decidir partir?  E se partiu entre nuvens? Cansada de ouvir preces.  desgastada por indiferenças. leva-nos aos seus labirintos, faminta como Artêmis. Testa-nos diante ao desejo de caos. Respira por nós o cheiro  da chuva por vir. Mostra os devires  que nos expõem à vida. Embrulha os homens  em visões de abismo, e reconhece-o  como reflexo nunca visto. Mantêm os olhos abertos ao nos ver passar. Voltada às coisas que não vemos. Socorre-nos, enfim,  de um fim do mundo qualquer. É sagrada ao buscar perder-se:  aqui, no único tempo que existe. Sempre a um passo de salvar-se de nós,  a fé deixou-se ir,  sabendo que voltaria: renovada. Se há de seguir,  nos seguirá.  FUMAÇA & BELELÉU                                                     Queima o céu.  Escurece o Sol. Torra a selva. Come o pasto. Terra s

DOIS POEMAS DE LOURENÇA LOU

Imagem
  ABISMOS olho nos olhos do dia : café epidêmico vis comboios de vírus religião vendida em votos epístolas de ódio desabaladas calmarias sentenças de deuses-néscios acenos cumulativos de rasgado desamor (minhas dez mil ilusões de suaves paraísos  trancaram-se nos armários  das crenças infantis)  ignorando  as alegorias do divino reforço minha fé  na palavra em que me reconheço  onde pulsam os abismos  cursos sanguíneos da salvação de cada dia. ASPEREZAS há uma poeta  aprisionada  na mulher a escarpelar  suas paredes ambas escorrem ranhuras  de seda  e sedução às estranhezas elas sustentam  suas amnésias há uma mulher aprisionada  nos versos uma poeta de asperezas  viscerais ambas se moldam nas simbioses da língua e entrelaçam-se nas reinvenções  da palavra.  

DOIS POEMAS DE DANIELA PACE DEVISATE

Imagem
  INJEÇÃO Inoculei veneno-poesia numa dose letal o baque na veia estrelas bêbadas versos  velozes intoxicando o sangue quente  de música ADEUS Rebuscava os baús e embaixo das almofadas o teu retrato, a diluir-se como um reflexo que desmanchava minhas mãos tentando capturar os peixes no tapete sem água

UM POEMA DE DIRCE CARNEIRO

Imagem
  CASULO sem o sal das palavras o sabor dos verbos o paladar dos sons Seguem os dias  cinzentos a bruma  entre viver e existir Cedo à dieta magra impulso  de só permanecer enquanto o corpo  elimina excessos A dialética já não seduz não acende vocábulos  no mundo gordo de vazios Deixo o curso esvair-se um rio não olha para trás  nem luta contra barreiras

TRÊS POEMAS DE JORGE AMÂNCIO

Imagem
  PIXAIM O corte de cabelo que fizeram    não me agradou.  Engoli  o som incendiário  das palavras.  Esqueci na gaveta  os nacos  encaracolados. Perdi o tempo  em horas mortas  num pesadelo. Acordo na cela da cadeia  sem saber  por quê.    O LADO DIREITO DO SILÊNCIO  negros e pobres o extermínio da história, assassina da memória pobres e negros instrumental mecanismo, sangue da discórdia pobres e negros racismo estrutural, espírito da paideia pobres e negros cortiços, favelas, ocupações, feitiços pobres e negros cárceres, sem-teto, de rua, famintos pobres e negros sem escolas, sem saúde, extintos pobres e negros anúncio do suicídio humano pobres e negros genocídio e silencio pobres e negros pobres e negros JOGO DE DADOS deus joga dados com o universo, no por vir. universo joga dados com deus, no pretérito. lancem os dados

UM POEMA EM PROSA DE EDIR PINA DE BARROS

Imagem
  “Entre estatais E multinacionais, Quanto ais!” Carlos Drummond de Andrade A serra de Itabira, com seu Pico do Cauê, antes de ser a riqueza maior dos Andrades, foi terra de Botocudos. Eles foram caçados, com auxílio de cães farejadores, alimentados com carne dos seus pares, vencidos a ferro e fogo.  Agora não existem mais índios, nem serra, “com seu perfil grave” que podia ser contemplado da janela do casarão.  Nem a Matriz do Rosário. Os craí reviraram a terra, como vorazes bandos de queixadas famintas.  A Vale minerou o Pico do Cauê até virar cratera. Abalou o alicerce da Matriz, que tombou ao chão.  A fazenda dos Andrades virou um campo de rejeitos de minério. O maior trem do mundo não apenas levou o coração de Drummond e a serra “britada em milhões de lascas” “para a Alemanha, para o Canadá, para o Japão”.  A imensa serpente Guapók - monstro que vomita fumaça – nunca mais parou de correr. Desde então urra dia e noite, arrastando seus 150 vagões e cinco locomotivas, rumo aos portos

DOIS POEMAS DE DANIELA PACE DEVISATE

Imagem
MUDRAS é sêmen ou chuva o que rega a noite? as mãos abençoam vertendo sândalo sagrado sacerdotisa de róseo manto em transe extático trânsito travessia e quatro mundos estremecem ao ímpeto do nosso amplexo JARDIM SELADO Cercado pelo muro de cristal o jardim respirava o eflúvio do roseiral em flor e no centro um botão desabrochou ao receber em cheio a lágrima fulgurante que o serafim derramava do alto azul celestial

DOIS POEMAS DE LOURENÇA LOU

Imagem
  OSSOS sem tato cor e olfato  esqueletos rendem-se  ao escárnio. aos humores da lua lençóis d’água  se incendeiam entorpecendo as esquinas  do sexo  no fundo tudo são ossos   a vender-se  em abundantes “q r codes” sob a ironia de um céu de indiferenças. a cidade dorme devendo  muito mais que uma chuva fina  sobre o fogo nas “gazas” do capitalismo. DESORDENS DO TEMPO dias e seus destinos conjugação de segredos e avessos voo e seus vazios invasão de silêncios e insetos história e suas memórias  insubmissão das cenas e semeaduras tempo e suas desordens floração de espantos na poesia.

DOIS POEMAS DE JÓIS ALBERTO

Imagem
  UMA BEATA UM BEATLE UMA ARANHA E UMA MANGA COM LEITE rabo de lagartixa decepado, tem vida complexa: mexe-mexe por uns segundos, faz parte deste e de outro mundo: uma beata um beatle uma aranha e uma manga com leite, pelos bigodes de Dali: se conhece o retrato do artista surrealista quando jovem, perdido em algum lambe-lambe perdido no tempo: se conhece o retrato do artista marginal quando jovem QUANDO MEU CORAÇÃO FORMIGA o meu coração é feito morcego amo e não tem jeito o amor desajeita todo meu ego amo e o amor é como eco é amando que me guio quando estou só mas não se pode estar só quando se sente amor pois o amor é uma amiga a gente nunca briga mesmo quando meu coração formiga 

TRÊS POEMAS DE EWALDO SCHLEDER

Imagem
  OUTRO LADO DAS IMAGENS Enquanto o gado pantaneiro engorda na Bolívia, queima o pantanal selvagem. Arde em chamas o país do futuro, esse coração verde inflamado criminosamente. O que será da fauna e da flora,  o que será do homem, nesse desencontrado  baile da raça morena? O que será das Américas? Fogo de pau-brasil, esgoto de querosene? mãos brancas  tingem a terra TOM.COM Essa pedra  que rola os ares é uma nota poética mais do que pedrada. Essa pedra é bit é bruta é break é matéria prima essa pedra é hit da cibernética TERRÁQUA machucho mar bravio brioso cobre as dunas contas musgos cristalinas cristaleiras caramujos olas anchas aladas tombam em cristas de jade tunísia e cristais Poros molhados a areia pele de sereia espelho céu narciso monumental espumas plásticas esporros brumosos Lá em cima atroz imaginação a martelar planícies planaltos charcos subúrbios cascatas cascalhos plutão mercúrio evanescente carbono metanos gases sagrados e profanos terráqua: o vento Pés na lua pó da

UM POEMA DE JORGE AMÂNCIO

Imagem
  PODEROSA, FAZ A MORTE, FAZ O BEM no início todos somos mulheres. Nanã a gênese  que viu a criação  do universo o berço está na mulher. alquímica  fêmea-macho céu-inferno yin-yang,   bem e mal o criaram.  corpo  mente sopro  virtudes  gozos  vícios, o fim está na mulher. do prenuncio da concepção ao conforto. núncio de Nanã, a velha senhora,  da vida e da morte

UM POEMA DE MARLI FRÓES

Imagem
  O MENINO NO HOMEM Vestiu-se de uma tristeza- labirinto  com muitas saídas e também um fundo sem fim não quis nem blues ou bofetão na madrugada não restou nada a fazer agarrou-se ao oco do mundo, ao vazio impenetrável como o grito surdo-mudo

CINCO POEMAS DE DANIELA PACE DEVISATE

Imagem
FANAA Mais além dos rostos na meia noite transcendente onde os nomes flutuam como lótus num lago após serem unificados no fogo de dor e amor: um fogo alvo fogueira de lírios que se dissolvem no Oceano de Perfumes * * * Somos estrelas errantes emaranhadas de carne perecível com flores no peito que desabrocham dolorosamente gloriosamente enquanto a ária dos pássaros distrai a aridez da fome e aguardamos a noite essa espécie de abrigo provisório porque a vida é uma coisa muito precária * * * Oh amado como anseio teu rosto reluzente camuflado nas coisas do mundo nuvens irisadas se precipitarão em chuva que se mistura à saliva no céu da minha boca enquanto você acende estrelas nas palmas das minhas mãos noturnas vê esses sinais? aqui está marcado nosso encontro eterno adiado por engano VOA, GARÇA VERMELHA ops, erro voa uma garça no quimono vermelho da deusa do Sol ORQUESTRA Astuta, a lua tramava a móvel partitura ela maestrina de sapos convidava os músicos cegos e crianças para o seu coral

UM POEMA DE ROSANE RADUAN

Imagem
  MEARA Deito-me na relva ondulante e espero. Meus olhos semicerrados veem de relance teus pelos branco-prata a crina longa surgirem por detrás da colina onde desponta a lua cheia brilhante. Fecho os olhos não preciso deles para te ver sentir me aconchego ao teu corpo altivo digno sinto teu sopro doce suave minha alma minha essência. Canto tua forma danço teu nome inebriante pulsar sela nosso pacto de nascer e renascer como um.

UM POEMA DE JOSÉ COUTO

Imagem
O AMOR É AZUL, SEGUNDO A TARDE para Lázara Papandrea aqueles seus versos escritos sobre as águas pela menina nas nascentes dos rios desaguaram suas imagens e infinitas transparências na imprecisa manhã que se insinuou com as mãos em concha bebi de tua paz reverberada nas entrelinhas dos poemas lavei o rosto dos excessos e um silêncio ensurdecedor e desmesurado derramou em meu peito uma vertente fugaz capaz de recolher do vento e do amor segundo a tarde algo assim como pássaros azuis habitantes desse livro para presentear desconcertante leitores desavisados

UM POEMA DE MARLI FRÓES

Imagem
  VOOS LETRIS Pousarei no girassol  van goghiano fertilizarei  todas as sementes noite é para vaga-lume! rasgarei o véu  e o ventre subirei no telhado e acasalarei com o vento vou parir mil vezes letras tortas nesses papeis de areia nas vagas do mar e outros unguentos Ficarei sem asas  e sem chão Flanarei na vida,  no gozo e na morte E no sétimo dia  (des)cobri-me  letra morta

UM POEMA DE PAOLA CRISTIANE

Imagem
  ESCARAVELHO Cravo a pata em meu fio branco. À tua bunda preta que ascende ao sol. Te levo como amuleto, a morte que me passa. Somos tu indo para outro mundo.

UM POEMA DE IOLANDA COSTA

Imagem
  e a terra tremeu era aganju pela fresta da crosta. aquele que habita as câmaras de magmas, aganju, roncou pelas frinchas. aquele que vive no fundo da terra, recolhido, aganju, roncou pelas fendas.  aquele  que  habita  o  fogo nas entranhas da terra, aganju, roncou pelas falhas. boca e garganta são aganju. não silencia. costa e  ombro  são aganju. não descansa. seus olhos do  escuro  que  a tudo  enxerga. seus  ouvidos do silêncio que   a  tudo  escuta.  do  recôncavo,  do paraguaçu,  do  jiquiriçá, do baixo sul, da baía  de todos  os santos, os  homens  e seus abalos sísmicos. os homens e suas cismas.  os  homens,  quizila  de  aganju. come  amalá. come bode  castrado. orixá de terra firme. orixá de terra inculta. defende os menos favorecidos. parte o coração do inimigo no oxê

UM POEMA DE JADE LUÍSA

Imagem
  O QUE NÃO CABE NAS PERNAS I. Calor obtuso: carnaval limiar entre a dança e a queda. II.  Gozar todos os fevereiros  que o corpo tem direito.   III. Brindar a lágrima lamber os ossos Árvores do sul fazem mais amor que as do outro hemisfério.

UM POEMA DE FLAVIANO VIEIRA

Imagem
  VERBO SEM NOME errâncias de verbo criança na graça imerso com verso código que sente é cria da fala dos sonhos da caça almoça e abala o dígito que mente transmuta a cor  reforço da massa em luz e esplendor de voz renitente sentido em lume de riso e desgraça do amor ao estrume na linha que fende

UM POEMA DE JOSÉ COUTO & ANTÔNIO tORRES

Imagem
  TOTEM IV      a pele que recobre as inquietudes, o rumor do afogado dentro do oco veloz, sem voz para cavalgar o vento sobre o mar, pânico que segue os indóceis passos da tempestade o caos pede gritos de expiação, traga luz como se fosse um buraco negro, desconhece a paixão, que dilacera com seu cravo fino e atroz, no peito alumbramento, a voz secando meus exílios, minha incandescência, meus suores, odores e a raiz inacabada dessa flor de cera em meus olhos lassos, como se não mais houvesse alma, essa força oculta forjada nas chamas das dores e aprendizagens de resistência e luta em tempos vulcânicos, de chuvas de fogo e chumbo vamos girar o maracatu o congado a calanga a gira de xangô kawô kabiyesilê oxê alujá Arte Artur Madruga

DOIS POEMAS DE CARVALHO JUNIOR

Imagem
  DAS FUNDURAS   quantas gamelas cabem   no rego do poço do olho? o abismo é o umbigo do peixe e o chifre do pássaro, perdidos, na fenda da manilha da cacimba.   FORQUILHA Para Edmilson Sanches   o homem é peixe no (es)cambo, um riacho antigo de margem quebra- da.

UM POEMA DE EDIR PINA DE BARROS

Imagem
Ali é tekoha ... Lugar onde tinha casa, ogapysy , roça grande, cemitério, virou pasto,  agora é cana... Kaiowá proibido entrar, karai manda matar...   Mas ali é tekoha onde nasceram nossos avós, eles estão plantados lá debaixo do canavial. Karai é jaguaretêava , mas vamos acampar, fazer aty guasu...   Onde tem cana vamos plantar Avati Jakaira, levantar ogapysy , Karai incendeia ogapysy mas  Kaiowá ergue outra ogapysy ... Ali é tekoha .     NOTAS DA AUTORA  Tekoha -  o lugar (território) onde se vive,  de acordo com seus usos, costumes e tradições Kaiowa/Guarani, onde se realiza o teko , o sistema de valores éticos e morais que orientam a conduta social, o  seu “modo de ser” e estar no mundo. Ogapysy - oypysy ou ongusu – “casa de reza”, de rituais sagrados, conduzidos pelos ñanderu ,   líderes religiosos. É o local principal onde ocorrem os processos de transmissão de conhecimentos e onde ficam seus objetos rituais como o Yvyrai, Xiru e Mbaraka . Nela se guardam sementes do milh

UM POEMA DE JORGE AMÂNCIO

Imagem
  SALV'ELAS Baobás invisíveis  plantam a imutável  identidade,  semente  da negritude. Genes da criação deixam a luz da sabedoria no DNA da memória. Renascidas  na lente monocromática, do olho cego que  humilha, agride e mata, que se diz superior, que se apropria dos quereres. Flores invisíveis lutam pelo instante, abraçam  a esperança, oram  (in)certezas. Choram  pelo filho  que jamais verão. Salv’Elas

UM POEMA DE JÓIS ALBERTO

Imagem
  DA JANELA Da janela da solidão Vejo uma mulher grávida De guarda-chuva Vejo uma mulher de guarda- Chuva grávida Uma mulher guarda uma (ou outra) vida da chuva Aquela vida guardada sabe Que a mãe guarda seu filho Da chuva Que a mãe aguarda seu filho (ou filha) De uma natural forma como se Aguarda chuva ou sol.

POEMAS DO PANTANAL

Imagem
REVISTANDO O PANTANAL o cervo-do-pantanal berrou água a onça-pintada urrou fumaça arara-azul grasnou homem jacu-de-barriga-castanha cantou a desolada aridez ariranha regougou aspereza anta assobiou labaredas jacaré rugiu fogo seca  sucuri sibilou destruição lagarto gelou desmatamento capivara e o tamanduá sem forças não silvaram queimados Jose Couto IPÊS-ROSAS deus não esteve nas entrecascas amolecidas de seiva dos troncos sulcados das peúvas quando elas se incendiaram, no pantanal. o fogo não veio dos raios que as chuvas trazem. os homens fizeram o fogo para espantar os mosquitos. os homens fizeram o fogo para renovar os pastos. os homens fizeram o fogo para o seu agronegócio. para o seu agroenguiço. deus não esteve com as rosas senhoras florando, suas folhas caindo, compostas, oblongas, demoradas. nada havia entre elas, as ipês e a seneh do horeb, a tal acácia, em chamas, não consumida. não consumada. não era uma visão, um enteógeno, uma miração de moisés, uma revelação divina, uma p

DOIS POEMAS DE LOURENÇA LOU

Imagem
HÁ MUITO NÃO TE DESENHO ELEFANTES não tenho muito tempo depois de tambores e decibéis elevados a noite já se anuncia luminosa da janela vejo flores a enfeitar  o inverno que se anuncia rio perene como este desejo  que em mim é conteúdo de plumas doçuras gratidão de tantos ontens há muito não te desenho elefantes que nos acheguem na distância de suas patas nem te dou de presente pérolas assentadas  em mil seios de conchas talvez devesse esperar junho seria quase nada fazer do seu dia alusões a uma vida poética que dribla geografias lança redes em todos os meses do ano e distribui peixes multiplicados  em estatísticas de carinho não tenho mais tempo talvez amanhã eu te desenhe braçadas de luas  a deslumbrar teus caminhos COMPASSO Ao poeta Ernesto de Mello e Castro meninas se deixam dores dores não morrem nas ruas ruas se deixam em casa casas morrem em meninas casas engolem as dores dores se choram nas ruas as ruas engolem meninas meninas choram sem casa dores se deixam em casa em casa se

UM POEMA DE REGIVAN SANTOS

Imagem
  a vida passa entre os dedos do poeta seus dentes espremem os dias os olhos veem as árvores engolirem o sol sua redenção está na boca da cova                                     [mas] na cova não há leões                                   são poemas/ maus poemas não existe fome alguma e a sede é lembrança de um tempo em que não existiu vida

UM POEMA DE CARVALHO JUNIOR

Imagem
  ESCONDERIJO   palavrinhando e passarinhando por dentro,  este silêncio que me alinhava e desemenda é pluma – desencravada – na tala de bambu.  

UM POEMA DE JOSÉ COUTO

Imagem
  O CARBONO TRANSLÚCIDO I só eu vi luzes turvas do alumbramento nas dissonâncias do desamor-imperfeito só eu li o sol dentro do verso fragmentar cristais límpidos desejos transformados em náufraga   só eu revivi a desolada alma do pássaro gerar a desordem o poema decifrar o vórtice desencadear fragrâncias amorosidade equilibrista   só eu concluí escrita extensíssima de ecos diamante raro lapidado essência vaporosa da lágrima frêmito da navalha no lábio vertendo luz na palavra indizível revelações materializadas nas entrelinhas pontiagudas II linguagem: abismos dos avessos forjando inesperadas trilhas vestígios de nuvens sussurrando dentro caos da paixão amplidões, ressignificados lapidados, reinventados tatuados no que nos tocou profundamente e permaneceu   alucinando perplexidades desconcertando sentidos dissolvendo epifanias dissipando sobras encurralando no canto do mais intrincado labirinto o leitor vencido, submerso  

CINCO POEMAS DE DANIELA PACE DEVISATE

Imagem
  FLORESTA DE SÍMBOLOS na mata cerrada das palavras algumas árvores são lendas mas as flores são poemas MATÉRIA-PRIMA   n osso amor de cristal atravessou labaredas naufrágios joguei no fogo não queimou joguei na água não se molhou ÁTOMO desfrutar desse instante de ouro habitá-lo como a um fruto boiar dentro dele útero em plenitude depois nascer no corpo do devir, carne futura VEM meu amor, beija meus olhos e bebe as lágrimas da noite quente: sol substituto em nosso céu duplo   ORÁCULO RANDÔMICO   V ênus em trânsito Sol em exílio Lua em Virgem a 12 graus de Peixes, a carta do Eremita afundo a mão nas runas e tiro a pedra IS o gelo o I Ching aconselha: o Homem Superior não se aflige quando está só nem se abate quando deve renunciar ao mundo

UM POEMA DE EWALDO SCHLEDER

Imagem
  PEDRA DO MAR - paráfrase do poema O albatroz, de Charles Baudelaire - Na garupa de um albatroz saio para a nascente à procura da vida que me foge das mãos. \ Agarro-me ao dorso do bicho em extinção, a sentir a eternidade colada ao meu peito. Batem as asas e os corações. Sobre a pedra do mar descansa a enorme ave. Se faz dona do mar –  e na verdade o é. Estende sua envergadura cobrindo o mapa mundi. Se o leão é o rei das selvas, o albatroz tem o reinado dos ares. Voa alto e tinge-se azul. 

UM POEMA DE JORGE AMÂNCIO

Imagem
    PENHORAS & PENHORES Saúde borda estrela de seis pontas à pele ébano,  noite dos cristais. Educação muleta do sono, uma anaconda velha arrastando-se na árvore da morte.  O São Jorge, o coité, o alguidar os vinis da clementina de jesus o cão andaluz a persistência da memória o nome da rosa do povo, conquistas diluídas cárceres enegrecidos necrotérios corroídos manicômios suicidas, penhoras e penhores círculo de horrores.  O amanhã cada vez mais longe cada vez mais ontem. apoiam a casa grande sem saber que são escravos. 

DOIS POEMAS DE JÓIS ALBERTO

Imagem
  RECOMEÇO Da estética, a chave,  não o chavão. Da poética, as margens, não a pabulagem. Da caixinha, o clímax, não o clichê. Do barulho, o baralho, não o trocadilho. Deste chão, os meus pés, as nuvens não.  Da moral, a existencialista, não a capitalista. Da ética, Aristóteles, não Mefistófeles. Da retórica, a dialética, não a hermética. Deste Yin e Yang, o streaming, não a Samsung.  De Baudelaire, o flaneur, não o miserê! Da Alemanha, o poeta Heine,  não o tirano Hitler. Da Rússia,  Maiacovski, Não Jdanov... Do Brasil, o povo brasileiro e fora Bolsonaro! Dos Estados Unidos, o jazz e o trompete, não Trump e chiclete! Do coro, o descontente, não o da gente! Da música, o diapasão,  não a dispersão. Do poema, o recomeço, não o fim.  FRONT anfiguri     figuri- no      maqui      manequim  paradigma fundibulário fuligem fagulha                                                bestiário                                                leviatã bilontra                   bazófia                  

DOIS POEMAS DE MAURÍCIO SIMIONATO

Imagem
  FORMIGUEIRO A borboletinha morrida coloriu o chão de tanto chispar o céu. Foi abatida de vida pra ressuscitar,  aos pedacinhos,  dentro do formigueiro. VENTANIA   Perder o passo ao vento que se refaz em outras paragens,  desfiladeiros. À tarde  já nos deixará em algum lugar que se encontre ausente Cantos, assovios, motores, luzes, latidos, labirintos, latitudes, dissabores. Qualquer coisa que se pense perde-se ao vivo e nem sempre em cores.  A vida nos arranca de tudo. Contudo, perca-se  até que não se ache mais. Ela nos encerra descaradamente, a cada instante, arrebatados.  Leva respiros e reflexos. Rompantes. Rapta folhas em queda  ao torná-las livres para se perderem orquestradas num             zigue zague                    até qualquer chão. Para arvorarem-se aterradas.  Viver é desarvoro  no tempo a dissipar-se.  Tudo a perder,                                        vivo.

DOIS POEMAS DE MARLI FRÓES

Imagem
  ORGÂNICA Ouço a canção da terra e ela me lembra que sou orgânica: feita de barro, sementes,  folhas,  luz de estrelas,  águas de córregos e cacimbas. A minha janela  fica no mundo - nele eu habito  porque a vida  é amplidão que minhas vistas  alcançam ou advinham: quem tem asas  não se prende ao não. Sou catrumana – forte como semente de baru flor do cerrado mistura da cana e do melado. Não temo a vida ou o pecado nas minhas terras  Deus sempre chega cedo e tudo se resolve num dedo de prosa, Já o tinhoso ficou em Guimarães Rosa Venho de um lugar  onde a casa pode ser o coração. Para Ivana Ferrante Rebello Marcelo Lelis  Andréia  Glaicielly Dieger Rocha ESTÁTUAS DE SAL espelho perdido ela levanta cedo e sai para o trabalho seus vencimentos  diluídos nos boletos deixa a casa ordeira sua vida nem tanto porque tem sangue e não é o tempo da lua espelho perdido maquiagem... ainda não inventaram  nenhuma  que cubra os hematomas  do lá de dentro porque tem sangue e não é o tempo da lua hemat