DOIS POEMAS DE SÁVIO DE ARAÚJO
RESQUÍCIO
O fundo negro das folhagens
atravessa minha carne.
A sede dos corpos ecoa
nos vales turvos do tempo.
Asas de mariposa inflame:
trilhas de amor e crueldade.
NEBLINA
Luz da noite,
prata azul lunar
nas caudas negras
de teu rosto.
Fendas cintilantes
entremeiam nossos atritos.
Músculos, fibras tesas,
gestos cálidos, líquens.
Somos agora justificativa
para o acaso que nos une,
escolta pueril da terra
que flutua no lúmen.
Apenas palavras abstensas
(lastros abertos ao fogo)
poderiam dizer tais coisas,
e por isso sou um náufrago
dessa liberdade, a devastação
no pesadelo de homens comuns.
Saber melhor depois do fim,
lembrar de reinos duplicados,
caçar abismos em limite,
sangrar a crueldade dos caminhos,
limpar chagas com novos hinos.
Voltam assim tuas safras
colhidas por lâminas cegas
e as penumbras desse ardor
caem sobre meus pés
como o solstício
de um nítido dilúvio,
onde imprevisíveis lampejos
inscrevem nas pedras
a tua cuidadosa presença.
Comentários
Postar um comentário