TRÊS POEMAS DE MÁRCIA TIGANI
TORDESILHAS
Minha dor adormece na areia
Em praias ocres de utopias.
Minha dança é uma sardana,
num mundo desigual
Terra e homens são ilhas
Segregados por cores
Meridianos separam
e demarcam territórios
Mas a minha língua é varia
e encontra seu tempo no verso
E o verso subverte a latitude
para expressar em voz a dor universal.
* * *
Um barco absoluto e tardio
arrasta velas e âncora
entre sorrateiras ondas
e sorrisos de anêmonas...
Anseiam por terra à vista,
morte e vida à espreita,
Entre a brancura da espuma
E o agudo lamento das baleias.
As velas, esguias, insolentes
desdobram-se no tempo:
em tempestade e calmaria
cumprem seu destino ao vento
A âncora, inerte em seu sono de ferro,
na quase paciência de mãe,
aguarda o momento certeiro
de firmar seu filho ao chão
Âncora, esperança em cruz,
mão em desvelo, silenciosa
elemento atento, mudo,
Imagina portos lendários
Seguem juntas, em meio a cordas
Ao ancoradouro das tardes
onde barco, velas e âncora
Sonham com o sonoro canto de sereias
O HOMEM E O MAR
Havia um vasto mar_
desses a se perder de vista_
e sobre ele um barco
e dentro dele
um homem.
Um homem solitário,
no silêncio das manhãs
sem horizonte
sem peixes :
apenas homem,barco,solidão...
Dentro do homem seres abissais,
desses encontrados nas profundezas ,
do imaginário oceânico decomposto,
como fábula de esponjas e líquens
que assola todo homem só.
Em sua longa espera
na precária esperança que é viver,
havia ali um homem feito de ausências
E seria o mar azul dos poetas
não fossem a memória cinza
e o desejo rubro,
e o desespero pálido,
nas curvas do tempo,
A arquitetar enigmas e sulcos
na face do homem solitário .
Uma face de presságios e miragens
nos arremessos do barco contra rochas,
Em geográficas formas de desespero
das ondas e cheias da maré
E a noite seria ainda longa e incerta
e o homem descrente e exíguo
Não fosse a alma anonima
Que clareia o dia
Nas sendas do destino que o consome
Comentários
Postar um comentário