UM POEMA DE JOSÉ COUTO
ESSE RIO
porque não pude compreender o silêncio dos deuses
o perfume das nuvens e o voo do mar entre as rochas
tive saudade da vida que não vivi em estagira na macedônia
porque não soube decifrar as escrituras
que corpos em simbiose tatuaram na pele
palavras que árvores gotejaram no pássaro aurático
em gozo
tive que fingir me banhar no mesmo rio
onde almas exalavam fragrâncias
de memórias em decomposição
porque me assombrou o abismo do peito
abraços imprescindíveis repletos de voragem,
cosmos retraindo-se para depois fluir desmedido
tive que colher estrelas incandescentes
de possibilidades e encantamentos
antes do feito maior de prometeu
porque guardei fragmentos de auras forjadas,
estilhaçadas, ressecadas de luzes e orvalhos
Inesperadamente estou aqui desnudo
voz fora das estações
ecoando palavras dissolvidas
nesse rio heracliano
ponto convergente de todos desenganos
entretanto
dissonâncias de fluidos sutis
diluindo-nos em profusão
ainda reverberam
o amor:
das bocas
a sede mais corrente
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