DOIS POEMAS DE MÁRCIA TIGANI




















LABIRINTO

Tenho asperezas
que me acompanham
desde antes de nascer

Tempos de ausências
em solo arenoso
de desertos despojados

Meus pés tateiam
o calcário de memórias
de um mundo paralelo

Torno à geometria
de coisas esquecidas
e de ossos guardados

Em sua porosidade
levam- me a minerais
e líquens de outras eras

À um canto de sombras
ergo minhas lâminas
que cortam os nós

Como um punhal
atravessando a passos lentos
a mansão calada

Da janela ouço
a procissão de mulheres
moldadas a ferro e pedra

Seus cânticos falam
de lutas e misérias
mas possuem ternura

Na parede ocres retratos
guardam sorrisos
em tinta quase incolor

Um terreno movediço
em trilha escondida
sob densa vegetação

Convida- me a ir além
sob noite sem estrelas
a terras nunca pertencidas

Águas abissais
Trazem- me à superfície
Já quase sem ar

E de novo fecho- me em concha.


ELEGIA II

Os mortos esvaem-se
e partem em naves
que chegam sem aviso.
Abrem-se clareiras no solo
de onde se supõe
estarem seguros;
de onde se supõe
sustentados por algum poema
protegidos de espantos
e da precariedade do ar
À nós a morte não nos avisa
o tempo de chegada à outra margem:
Agoniza-se ou se desligam
sinais vitais obrigatórios
como rituais em desalento.
Lá se vão os mortos
assim exauridos, assim prosa
embevecida de alguma poesia,
e de mistérios indevassáveis
e vertigens inoportunas
Partem como um canto
Sempre inacabado
Com carências de entendimento
das ardências do dia.

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