TRÊS POEMAS DE SIDNEI OLÍVIO
A QUASE GEOMETRIA DO VULTO
ela surgia em quase dia. esguia. quase elegante. na anatomia
incerta de uma bacante. coisa informe. conforme a quase
geometria do vulto.
ela sumia em quase noite. fugidia. quase tão rapidamente como
surgia. um vulto. um raro espanto. um susto. num quase surto
de melancolia.
o quase sorriso na face e o negro soslaio era quase o
cumprimento da chegada. e o segundo exato
da partida.
(nesse intervalo
halos de sonho e silêncio. palavras
servem apenas para registrar momentos).
A PLANA GEOGRAFIA DOS ACIDENTES
Bem aqui nesta esquina o desejo
e a dúvida da ventura. A geografia plana
dos acidentes na plena urgência das horas.
Aqui é onde eu sempre te espero
entre as paisagens de concreto e os sinais
intermitentes na rotina insana dos dias
sobre os escombros da cidade.
Aqui nesta precisa esquina
desse prolongado instante
alguma coisa em mim ainda resiste
além dos desfeitos planos.
A promessa concretizada nas palavras escritas
a ferro e fogo nas linhas contínuas das minhas mãos
e no vinco sorridente do teu rosto
serenando a renúncia.
VÍSCERAS
a casa não resistiu às estações
nem às artimanhas arquitetônicas
do passado
: veio ao chão
com suas vísceras
e veias
restando apenas o esqueleto armado –
vigas de cimento
e cal
sem a cor rosa que a sistematizava.
as salas, a cozinha, o banheiro e os dois quartos
foram desfeitos
(não há mais nada de interior)
: baniram os fantasmas
que povoavam os forros
e persistiam aos anos.
mais do que a história
derrubaram o alpendre
(o alpendre onde
naquela noite de junho
apenas as estrelas
testemunharam nosso beijo).
nada ficou impune
: o pequeno quintal
a árvore em frente
a minha memória
que se desfaz lentamente
como as lágrimas na insônia
das horas
desabando sobre o dia.
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