UM POEMA DE SIDNEI OLÍVIO

 









1.


tudo o que num momento se engendra 

depende do desejo de se entregar ao desejo

um sentimento liso como a lâmina 

que se agarra ao fio por razão e limite

que se posta à quina da sina 

e obriga a ganhar rotinas 

e a gerar tempo para sermos nós mesmos

(é sempre este o maior problema) 

a vida é basicamente o que fazemos 

com o tempo na esquina

um lugar onde o tempo 

permanentemente duvida 

da palavra branca que se tinge de ansiedade 

na contínua sílaba aguda da dúvida

o tédio de viver e a escolha do caminho

ainda na esquina 

um bêbado célere e trôpego 

entoará algumas passagens da carmina burana

(durma com essa)


2.


eu fujo do clima

recuso a esquina e recluso 

me adentro de pijama

eu não existo

é por esta e outras ausências 

que me despeço do passado 

e me junto à solidão daqueles 

que me viram passar

vou me lembrar por vez dos tempos idos eu sei 

com muita vergonha e arrependimento 

mas também com muita coragem (coragem repito)

escrever é a única coisa que eu bem ou mal ainda insisto

3.


penetro despido nos versos 

a surpreender o corpo e a observá-lo 

com a possível nitidez 

a poesia (o momento onde a palavra encontra 

o verso) 

é essa imagem real 

a verdadeira tentação de escrever 

é sempre um ato de coragem e um gesto solitário

(não esqueça que a punheta é de toda maneira solidária ao prazer)

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