HOMENAGEM A CARVALHO JUNIOR

 











PÁGINA EM BRANCO

 

Palavra é lâmina exposta.

A letra também.

A metade da letra, idem.

A dor da letra talhada é encenação

do além.

O corte do poema é.

O poeta, então, passa a ser o que deveras sente.

Quando cai aos céus

na lenta volúpia da ida ao irreal.

Passa a ser corpo

de algaravia.

Esquece o vazio

da página em branco,

que suporta o mundo.

Faz-se elipse.

Toma para si

o limiar dos silêncios.

Maurício Simionato

 

A EFÍGIE DA NOITE

 

A morte ecoa no vão da porta

eleva os cabelos do corpo estranho

e lentamente senta ao lado do amigo.

 

A morte ressoa nos quatro cantos do quarto

caminha no chão despido e louco

e deita ao lado do amigo.

 

A morte é a efígie da noite

sopro chapiscado no horizonte

apaga o ruído da rua

e o amigo já não existe.

Regivan Santos

 

BILHETE A FRANCISCO CARVALHO JÚNIOR

 (em memória do nosso irmão que partiu hoje)

 

Repara, meu irmão, como andam claras

estas manhãs de março, e esses navios

que ancoram seu pavor na nossa cara

e injetam em nossos ossos falta e frio.

 

Tanta coisa no mundo nos separa

do que é maior em nós, corta o pavio

do nosso estar aqui, e empurra para

ir garimpar estrumes de vazio.

 

E agora resta um mar por cavalgarmos.

E os risos cada vez são mais amargos

e até chorar nos custa um céu de rastros.

 

Nenhum luar. Nenhum. Nenhuma fresta.

O sol agora é um grumo que nos cresta.

Os que ficamos vamos nos teus passos.

Viriato Gaspar

 

 

CARVALHO

 

Força que reverbera no Universo

ainda ouço sua voz maranhense

vestido do manto da sua juventude

a espargir versos

da alma

da terra

das gentes

o zelo de pai

mãe

guerreiro

santo

diante do altar

sagrado

da sua Poesia

Dirce Carneiro


URUTAU

Para o Carvalho Junior

 

ave da noite

olho da noite

em nãos

de nunca mais

olho amarelo

nos fumos da noite

lua amarela

em nuncas

de nada mais

emenda-toco

de unhas curvas

uruvati, urutaguá

canta os pedaços de mim.

 

 

dito kuá kuá

dito pássaro-

princesa

canto de arame

e arranha-tripa

se acaso

se entremostrasse

no último infinito

do fim

esfumado

entre agapantos

e alamandras

entre os pedaços de mim.

 

 

uruvati

come-morcegos

urutaguá

come-lagartos

onde está

o meu eu

oh mãe-da-lua?

onde está

a minha ela

oh pássaro-

fantasma?

no último

fim de mim?

 

 

O que canta

no galho

transforma-se

em galho

o que canta

no tronco

transforma-se

em tronco

canto tonto

nos entornos

do sem fim

repercorre ângulos

no mais rascante de mim.

Claudio Daniel

 

Comentários

  1. Que saudade do poeta! Quanta poesia ele fez e ainda tinha para fazer...A sua voz ainda ecoa na leitura, na defesa, na construção e proclamação dos seus versos, versados na sua terra, sua gente, sua aldeia...tão universal.

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