DOIS POEMAS DE SIDNEI OLIVIO

 









ALGUM PEDAÇO DE TERRA

 

ao poema

não se intenciona o ouro

mas a terra lavrada

 

cordão de sementes

que veste o corpo

e mede o caminho

 

do pó ao barro –

grifo memorial

das impressões de início

 

escrever não é escolha

é viver condenado

às imagens do espelho

 

(altivez do verbo

gravidade estrita

que não atravessa a noite)

 

à margem do desfecho

não há encanto possível

apenas a salvação do plantio

 

(há que se bastar)


MAL-ESTAR NA SALA DE VISITAS

 

1. Sala de visitas

Enquanto o tempo passava, vertia meus olhos nas imagens ao redor. A sala repleta de livros e objetos estrangeiros. Uma luz tênue vestia o ambiente em tons mornos, quase mórbidos, provocando certa angústia. Ainda assim, o espaço despertava algum interesse. Detive-me na antiga cômoda suportando dezenas de fotos, estagnes feito uma árvore. Cada ramo decifrava aspectos do seu rosto. Cor dos olhos. Ondulação dos cabelos. Sobrancelha espessa. Formato do nariz. Ela jamais se moveu blindada dos reflexos. Veia sólida da mobília, todos os históricos vestígios denunciavam sua raiz. Exceto a boca. Pensei em questionar tal herança, mas me lembrei do que ela sempre dizia sobre incertezas: preserve o motivo e mantenha a boca fechada.

 

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

POESIA

OITO POEMAS DE SIDNEI OLÍVIO

NOVE POEMAS DE JORGE AMÂNCIO