TRÊS POEMAS DE LOURENÇA LOU
PRAIA DE CABO BRANCO
um deus desconhecido
ou escultor da
poesia?
tem altura e
altivez
para ganhar minhas
indecências
até em jogo de
xadrez
***
de sombrinha e
salto alto
leio joão cabral
de melo neto
recostada na
cadeira de praia
entre sabiás e
palmeiras
da praia de cabo
branco
surge o poeta
escultor
olhos de enigmas
me perfuram
areias engolem meu
juízo
mãos me acendem
fulgurâncias
arregalo-me por
inteiro
não sei disfarçar
o verbo amar
***
lâminas de sol
anunciam dia
respiro caos e
papel
descubro:
foram sonhos
adormecidos
desejos sem ética
lógica égide
talvez golpe da
inconsciência
:excesso de bolor
do livro que o
poeta não abriu.
À
HORA EM QUE AS SOMBRAS DESCEM
em meio à obscenidade das cruzes
um olho se arregala
do azul nascem pássaros
a tangenciar voos partidos
crianças saltam do sono
para a mira de fuzis
mulheres tecem toucas
para bonecas sem cabeças
tiros sangue sirenes
escorrem entre dedos cruzados
vida exaurida de desânimos
soluça entre vazios e procissões
aos ouvidos da noite
resta o grasnar do corvo de poe.
TIRO À QUEIMA-ROUPA
olho o menino cruzar a esquina
- eternamente -
em sua bicicleta de uma roda
um rosto cheio de pelos trovoa:
- onde estão seus peitos?
olho meu corpo
preparo um grito habitado pelo susto
: não há peitos
o vermelho dos meus cabelos
cobrem tornozelos e pés
o grito fica preso nas algas que me invadem
olho em volta
a cidade coberta pelo musgo do tempo
escorrega e desmancha-se em gosma de algas
o homem à minha frente
dentes de ouro a deslumbrar janelas
equilibra-se ao som de wagner
fujo na bicicleta de uma roda
agora sou eu a girar girar girar
até a engrenagem se enroscar nos cabelos
e me espalhar pelo chão
escuto botas ao meu redor
continências nazistas
o modo como me apontam
parece tiro à queima-roupa
seus reflexos fantasmagoram a cidade
e me afundam lentamente
no caminhão pipa verde-amarelo
de túnica e estrela na testa
ando sobre águas ao encontro do salvador.
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