DOIS POEMAS DE SIDNEI OLÍVIO
ÍNTIMO
TECIDO DAS RAÍZES
a lua míngua opaca
na hora extrema
(essa hora
onde tudo é possível.)
no jardim um poço cavado
à procura dos fantasmas
do sótão inabitável
que jamais adormecem
(e de tão habituais
já nem são notados.)
pedaços de ossos
dentes e anéis
que sobraram das falanges.
corpos rasos
ora dando identidade
às imagens mais antigas
dos cadáveres
pregados na parede.
nada mais se mostra na noite
impenetrável do chão.
tudo é sombras e pó.
carbono do eterno retorno.
cálcio que aduba a terra
e não sobe aos céus.
SIGNOS DE PASSAGEM
para Luciana Barreto
a tarde se estende
feito um rio canalizado
em avenidas perdidas.
corredores que emendam
esquinas, refúgios,
amores vãos,
verbos tecidos em lençóis
de hotéis baratos.
anseios mal-intencionados,
carregam imensa questão:
aqui estamos ainda
incertos do que será -
manter a forma
ou primar a rima?
faço as pazes com a dúvida.
deixemos tudo no chão,
esse acúmulo de luares
e palavras infames.
versos repetidos
habitando nossa boca
como uma memória sem ruído.
sentença de existir
para entender o possível:
transformar arte em lugar.
quadro que sustente
o corpo desvestido
de rosto ou nome.
DNA da saliva presa
numa xícara de café
ou na tampa da caneta.
quem sabe de nós
imersos na cidade
a ouvir oráculo das runas?
no futuro da hora
pisamos sobre as coisas
que já não cabem no mundo.
Belo poema.
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