TRÊS POEMAS DE SIDNEI OLÍVIO
GEOGRAFIA DE UM ROSTO
No primeiro gesto da escrita
o movimento da caneta
dava sensação de poesia.
Roçavam palavras
em suas mãos hesitantes.
Dedos sem ornamentos.
Uma língua atropelada
(desfiada pela caligrafia da voz)
esvaía-se em segredo.
A trama do texto
nas inversões sintáticas –
teias formais emaranhadas.
Disfarce de poucos verbos
para tentar explicar a vida
sem reflexo no espelho.
METAFÍSICA DE UM ROSTO
1
mudez a espera do grito
onde palavras imóveis
tornam-se ávidas
ao possível movimento.
atropelo dos sentidos
impassível gesto
da nota dissonante
na harmônica escala
desse isométrico jogo
de ruídos. o caos
afina o silêncio
enquanto deuses dançam
a música das esferas
no universo pitagórico.
narciso despojado
da primeira pessoa
(corpo e alma
no mesmo espaço.)
confissão das coisas
destinadas a serem
únicas.
estética do novo
que provoca
(nas melhores horas)
capacidade de olhar
a beleza capturada
pela nudez do dia
no entrelugar do tempo.
2
não silencie
ao que não se deve
calar.
palavras
de inequívoca expressão.
frases desentranhadas
do suposto embaraço.
urgência íntima
inconformada
com o mundo lá fora.
linguagem que se baralha
no ritmo primordial
do encontro com a poesia
(ardilosa essência
do verso.)
MEUS OMBRROS SUPORTAM O VIADUTO
paisagem noturna
que se vê do alto
reduz-se ao desejo instigante
de medir tempo e espaço
até o desfecho do chão.
lua que boia estática
na água correndo entre colunas
sustenta a velocidade do mundo
que emerge no desequilíbrio
das horas suspensas.
vida que mantemos
à custa de intenções
atravessa o olhar vazio
e faróis apressados
dos veículos na contramão.
Comentários
Postar um comentário