SEIS POEMAS DE NILTON CERQUEIRA
HORIZONTE DE EVENTOS
além
num furo
sob borda
captada
buraco negro
engole
impensável
véu de luz
sem sombra
de certeza
a não ser
a falsa
cor quente
que em laranja
engana
ÂMAGO
ventre do vento
vem
assovio agudo
fundo da fenda
escoa
fluido aguado
dentro do nome
engendra-se
o que dele some
UM VIÉS PARA SÍSIFO
I
crente no eterno
Sísifo
já cansado acima
carrega pedra
pedra escorrega
queda nutre
a mesma
espera penitente
redonda, perene
sólido tempo
que se remonta
espelho esférico
inamovivel norte
findar reincidente
para o desde sempre
sisudo Sísifo
eis que ele,
num susto,
tudo largou:
percurso e pedra
qual coisa
ocorrera a Sísifo,
escravo já moldado
à forma dessa sina?
aquele estrondo,
vindo do furo encoberto
pelo reflexo da esfera
deixou-o tonto, ferido
Sísifo se desfez
e refez, num relance
qual este súbito alcance?
que inédita ascese se fez?
II
atento ao mistério
repercutido neste signo
o silêncio de Sísifo restava
aberto ao furo da pedra
afinado a outro ritmo
no noturno ocaso
entoou em voz alta
estranho sonho
jaz, numa lápide
em letras-luz cor âmbar
anagrama ambíguo:
PEDRA PERDA
ele havia escrito
(no tempo enquanto lia)
em onírica língua
sua via de despertar
pedra agora decifrada
ainda era idêntica a si
contudo o susto havia
sustado o repetido traço
neste relevo nunca lido
uma borda se firmou.
do confim abissal
Sísifo florescera outro
segue senda sinuosa
sutil pavimento
feito de pedra escavada
reduzida a detritos
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