QUATRO POEMAS DE SIDNEI OLÍVIO
A MORTE DE NARCISO
depois
de tantos
escrúpulos
e gestos
premeditados
depois
de tantras
esdrúxulos
e tardes
eclipsadas
o amor
quedou-se
noturnamente
como se o método
do tempo
de sempre
adormecer
jamais
o tivesse
acordado
O MUNDO DENTRO DE NÓS
I
voo coletivo de aves
no fim de mais um dia:
repetição do cenário
no peso da existência
entre distância e limite.
lampejos de busca -
olhos entortam imagens
atravessados pela noite.
bússola da permanência
no silêncio do hábito:
confronto da espera?
II
na retina do mundo
as lições do tempo -
cuidado místico
com lugares preenchidos
pela ausência.
o tempo demora a passar
ao contrário das ruínas
que o circundam.
ao modo da tradição niilista
a procura do distante
estranho e diverso
para fortalecer
interesse pela vida.
III
detalhes da paisagem
na tessitura do enredo
embalado pela insônia.
um filme analógico
somente agora revelado:
aquilo que se concretizou
na memória (e que seria
bem melhor esquecer.)
MODOS DE SER
contraste de luz e sombra
beira o abstrato –
luminoso estilhaço
do ininterrupto jogo de versos.
*
nenhuma palavra é dita
por acidente;
conluio
confronto com o mundo
à sua volta.
singular desejo
de transgredir
na ousada entrega
às alucinações.
*
visão poética
mediada pela leitura
em que se embebeda:
fragmentos que não colam
nem se completam
como se jamais fossem
um pleno objeto.
*
lisura da forma
formato da mesura.
coisificação íntima da vida
e devoção à lua.
*
(talvez as folhas não tivessem
a cor certa
ou as flores
o cheiro da cor desejada.)
***
Com quantos anos alguém deve fechar os olhos para
sempre?
Refém da própria existência, partiu sem despedida num
dia indeciso de novembro. Sonhos pela metade. Ouvidos surdos aos apelos do
mundo.
*
(Imerso no barro esculpido da realidade, esperava um sopro
a se reconhecer semelhante.)
*
Herança da incompletude: o direito ao erro e à
contradição estampada.
*
Quem não aprendeu a ler regras naturais abrevia o
caminho das incertezas.
*
A idade é fábrica de conceitos, produto de gerações.
Dela, a notícia se completa no próprio itinerário.
*
Se apenas a matéria envelhece, a dor de ser eterno é a
mesma de não ser.
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