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POESIA

"A poesia parece estar mais do lado da música e das artes plásticas e visuais do que da literatura. Ezra Pound acha que ela não pertence à literatura e Paulo Prado vai mais longe: declara que a literatura e a filosofia são as duas maiores inimigas da poesia. De fato, a poesia é um corpo estranho nas artes da palavra. É a menos consumida de todas as artes, embora pareça ser a mais praticada (muitas vezes, às escondidas). Uma das maiores raridades do mundo é o poeta que consegue viver só da sua arte. Há dois mil anos, o poeta latino Ovídio dizia que as folhas de louro (com as quais se faziam coroas para poetas e heróis) só serviam mesmo para temperar o assado. E como poderia ser diferente? Como encontrar um modo de remunerar o trabalho e o ofício de um poeta? Rilke ficou treze anos sem fazer um único poema; Valéry, vinte e cinco anos! Outros consumiram boa parte da vida escrevendo uma obra (sem exclusão de outras) : Dante, vinte anos para a Divina Comédia; Joyce, dezessete, para a

OITO POEMAS DE SIDNEI OLÍVIO

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  GALO-DA-CAMPINA   A aridez do planalto seca a voz enternecida.   No rasgo da boca palavras turvas   ofuscam o tempo nesse mundo real.   Inverossímil manto cobre o mapa do horizonte –   derretido espetáculo sobre a face da verdade.   Da janela que espreito a rua ecoa um grito derretido   e das cinzas do fogo que tudo consome, nos salva   : ouçam o bater das asas do pássaro em voo.   RENTE À HORA   O dia termina como inicia – repleto de intenções e escolhas:   o equilíbrio das cores, prefácio que explica a obra, a eterna dúvida do fim.   Meio-termo entre poesia e prosa, cinza do céu, garoa fina.   Esperança do beijo, amor rente à hora, sina cercada de aço.   Um rosto desconhecido: troante desejo deste abraço mudo.   FACTUAL   Nada pior do que a certeza Arrisco um olho ao risco do espaço desabitado astronave rompendo o código do corpo que se ampara à borda do abismo   Ensaio

29 HAIKUS DE JORGE AMÂNCIO

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  4 HAIKUS E OS SEIOS   estrela de garoa garota organza cristal bicos pretos   banho cósmico garota seda musseline aréolas pérolas   fulgor do anoitecer garota crepe nuage mamas armadas   antemanhã ardente garota renda chantilly mamilos acessos     4 HAIKUS DO MORRO   guarda-sol amarelo   trovoadas azuis folhas douradas   noite lua cheia maquete do universo morro prateado   neblina da manhã estrelas prateadas acorda favela   céu de brigadeiro tríplex colorido festa na comunidade   4 HAIKUS FAVÉLICOS   balas rasantes flor-de-um-dia manhã sangrenta      arco-íris periférico dentes de ouro bocas de cadáveres   favela poente carros náufragos saraivada de balas   sinfonia no morro noite rajada pássaros não voam     4 HAIKUS PERIFÉRICOS   chuva fina pálido vidro inverno dolente   polícia alada dilúvio de bombas céu encoberto   vento tenso morro modo noturno

NOVE POEMAS DE JORGE AMÂNCIO

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  BILLIE HOLIDAY PROIBIDA (Strange Fruit)   amarga colheita essência magnólia sangue nas folhas sangue nas raízes frutas estéreis frutas estranhas   ... penduradas nas árvores   olhos retorcidos boca inchada sol apodrecido vento chuva frutos caídos frutas estranhas   ... para os urubus comerem   caricaturas-grafites lágrimas de pedras sangue nas folhas sangue nas raízes frutas negras frutas estranhas   ... então o repentino cheiro de carne queimando   FALO DE FLOR   flor estrelar luminescente    bifurca de azul árvore solitária   flor solar a árvore goteja punhais de sangue sobre raízes rosa   estrelou-se luminescente dama da noite   para sangrar o amanhecer     BATUQUE PERFUMADO   cidade cicatriz sangra o silêncio do sistema   recantos vazios decoram o palácio do espanto   lágrimas baldias moldam galáxias bravias   cálidas mártires flutuam grá