UM POEMA DE JOSÉ COUTO
MÁQUINA DO MUNDO nada se compara a esse entardecer a lágrima do sol avermelha o rio sem culpas esculpe desejos no silêncio mas quem verdadeiramente se importa? e no entanto essa beleza impregna de avessos a delicadeza que finda na luz que se despede tão pouco ofereceu esse dia que parte talvez um minúsculo fragmento de folha sendo levada sem rumo pousou seu desvelo aos meus pés e depois partiu em frêmito alucinante mas quem verdadeiramente se importa? entretanto agora nesse porto esvaziado de opacidades desprende cheiros familiares algo não tangível porém me escapa seu sentido se há algum transborda preso na garganta do tamanho de um navio atravessado mas verdadeiramente alguém se importa? a escuridão chega e nos abraça implacável vislumbro longe às fragilidades que o mundo sussurra despido do tempo que o dia me furtou reparo nas indeléveis cicatrizes que os cravos dilaceraram no centro das mãos e nesse exato instante revela-se a epifania das infinitudes perfumes óleos avelãs a mirra