NOVE POEMAS DE JORGE AMÂNCIO

 












BILLIE HOLIDAY PROIBIDA

(Strange Fruit)

 

amarga colheita

essência magnólia

sangue nas folhas

sangue nas raízes

frutas estéreis

frutas estranhas

 

... penduradas nas árvores

 

olhos retorcidos

boca inchada

sol apodrecido

vento chuva

frutos caídos

frutas estranhas

 

... para os urubus comerem

 

caricaturas-grafites

lágrimas de pedras

sangue nas folhas

sangue nas raízes

frutas negras

frutas estranhas

 

... então o repentino cheiro de carne queimando

 

FALO DE FLOR

 

flor estrelar

luminescente  

bifurca

de azul

árvore

solitária

 

flor solar

a árvore

goteja

punhais

de sangue

sobre

raízes

rosa

 

estrelou-se

luminescente

dama da noite

 

para sangrar

o amanhecer

 

 

BATUQUE PERFUMADO

 

cidade cicatriz

sangra

o silêncio do sistema

 

recantos vazios

decoram

o palácio do espanto

 

lágrimas baldias

moldam

galáxias bravias

 

cálidas mártires

flutuam

grávidas trágicas

 

pássaro-gárgula

no planeta cimento

toca

na guitarra láctea

preto rebento

 

áfrica incomum

trapézio perverso

afrodita oxum

reflexo do assédio

 

crápula sentinela

solitária orquestra

sangue aquarela

da reinante ninfeta

 

espetáculo imutável

camarote camélia

perfume da morte

no batuque ciborgue

 

DELEITE

 

banheira espuma

pétalas neve

toques de seda

 

mãos cegas

brincam no sexo

 

 

LEITO DE ROSAS

 

olhos boleros

escadaria selarón

papel colomi

poemas claros

cachoeira mosaico

batom carmim

 

 

LIMPEZA ÉTNICA

 

deter

gente

de

ter

gen...

te deter

gente

 

 

FÁBULA MEDIEVAL

 

choro silencioso

hematomas

fantasias

cantigas de açoites

 

armadilhas

clandestinas

lantejoulas

douradas

mocidade

maternidade

 

milágrimas

eróticas

 

episódio criminoso

na cidadela hóspede:

 

a criança-estatueta

na bicicleta bizarra

encontra na caverna

a menina algemada

e uma boneca-cadáver.

 

 

(IN)DEPENDÊNCIA E/OU MORTE

 

folhas de bananeiras

estalam

ao trote das mulas

 

delícias do mar

bolinam

o estômago imperial

 

aos olhos da belle époque

artistas

poetas

putas

enfeitam o jardim

dos sobrados,

mocambos

casa grande

& senzala

 

abduzidos da África

assistem

ao extermínio

dos povos

originários

 

bicentenário manto

da

elite antropofágica

embranquecida

 

vestida

de verde e amarelo

herança colonial

dos Bragança

e Habsburgos

 

frutos do mar

ostentam

a nobreza palaciana

em meio

ao mapa da fome

 

um mexilhão

contaminado

muda a história

 

no Ipiranga

limpam a bunda

com folhas de bananeira

 

 

(in)dependência e/ou morte

 

 INVASÃO DA PRIMAVERA

 

no piano

que

toca desafinado

entre

teclas marfim 

flores

 

na bossa

abelha rainha

guarda

flores de melodia

 

na chuva

que

ilumina o céu

entre

flores e bombas

ruínas

 

 

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