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Mostrando postagens de janeiro, 2021

DOIS POEMAS DE EWALDO SCHLEDER

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  ESPELHOS Olho para minha pequenez  e minha grandeza. Penso nas coisas da vida  e nas figuras humanas recortadas – frisadas,  borradas, vivas. Cogito aquelas que perdi,  as que deixei fugir. As que me escaparam  ou despencaram.  Pessoas e coisas.  O querer, o poder. Situações de vida  a decidir todo dia, o dia todo.  Coisas mínimas,  Médias, máximas. Quando fruto  da educação,  esse querer se arquiteta  entre fios de imaginação e células testadas na vida  desde sempre. Um dia  essa trama imaginária libera o ataque  e o movimento. Mas paralisa os sentidos do querer e do poder. Desprezam reivindicações.  As mais legítimas.  Em demonstrações a ignorar o tom essencial,  humano. Ao me tomarem  o livre-arbítrio, destruíram o meu destino.  Por duvidar de minha sorte, desde quando  era manipulada,  nunca pude bem  acreditar na vida. Mantive-me  entre as vertentes  da liberdade e da criatividade. Estas, potenciais das decisões  e do enfrentamento  à ansiedade e ao medo.  Loucura isto.  Porque

DOIS POEMAS DE SIDNEI OLÍVIO

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  O ESPÍRITO ERRANTE DOS POETAS SOLITÁRIOS   Frase extraída das páginas de um romance, verteu epígrafe gravada nas folhas mais duras, das violetas bordadas num jardim sem promessas.   Atravessou cidades inteiras, destinos, fronteiras, frangalhos de mundo.   Voltou imerso no rio que nos meandra, com águas salobras nos olhos sempre abertos ao descaminho.   Palavras que volveriam mensagens nos seus lábios de vogais coletivas, jamais tiveram eco.   (O tempo é satélite de todos os continentes. O canto esse espectro de vida.) ANDARILHO À PROCURA   andava montes e montes a desvendar ritos de viagem, a desdobrar horizontes   andava único e verso o universo como estrada (desgarrada do papel) ampliando formas e confins   (andava só e somente em busca de uma vertente uma epígrafe enfim que fosse e não lhe fosse o fim)

UM POEMA DE PAOLA SCHROEDER

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  ALÉM-MAR I Talharam na água a lembrança da terra. Vieram se espremendo na proa, abraçando um imaginário de cores. Do outro lado do rio há vida. Ir além e adentrar o mar. Suspiro vertendo dos olhos. Da origem desse mundo toda fuga é ceifada. Não para quem parte, mas para quem desembarca. Todos os outros ficam no caminho. II A ideia de pátria se dissolve  na carne cortada pelo frio. O beijo do menino é levado pelas ondas e amanhece cravado na areia. Seu corpo sem vida. III Ainda que não creiam os motores balançam a água. No desespero todo caminho é seguro. Tantas vezes vencida a morte resta o ar. A vida pulsa, não importa se entre muros. IV Mesmo a comoção que não é ínfima deixa-se ser filtrada pelo tempo. Mas o beijo, a areia, o corpo. Esses resistem.

UM POEMA DE MARIA MARTA NARDI

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  JUNTO A SILVYA PLATH   Não aprendi a paz na solidão do silêncio O silêncio é um esfolar de pálpebras em pétalas rascantes Tem gosto de ópio  e um segredo entre tufos de tule A noite em brasa busca a face que nunca consegui encontrar Um delírio ruivo afaga meus cabelos Melpômene me estende as mãos

UM POEMA DE JORGE AMÂNCIO

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  TÚNEL CURVO DO TEMPO o sol nas bancas  calça boca de sino  morte na br3 prerrogativa de sangue - 90 milhões em ação - lua nova e censura apesar de você jesus casa com shiva travesti da lambada marajás de minissaias vaca profana rumina pássaro narigudo estrela de poderes  lâmina que se atira nas cabeças jurássicas  jesus crucificado nu de tapa-sexo braços de shiva túnel curvo do tempo memória que não trai  o seio da negra de tarsila

UM POEMA DE LUCIANA BARRETO

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  ROSA DOS VENTOS   São vastos os ventos como pássaros sem pouso condenados a essa espiral infinda e fria Garganta clara a soprar mais e mais e mais caracóis aéreos, aves zonzas, areias suspensas.   Naquele corredor surdo de ventos destino algum se risca possível: o homem sem rosto avança insone a mulher de branco pisa as águas e os lírios se desprendem dos dedos.   São os ventos do norte que geram as miragens embaralham os dias, sustam as noites e em meio a barcos vazados de luz          – arbustos ardidos ao longe – um menino de cabelos de fogo               (e olhos de saibro) sabe o mar, o deserto, a fornalha            e na faixa larga e branca rabisca – distraído – a rosa partida.

UM POEMA DE MARLI FRÓES

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  ACORDES Dedilhados em cordas vibráteis - nos lábios-fendas,  a deslizar as dobras, dobrões -  arrancam  músicas selvagens:  gemidos, sussurros composição melódica acorda  homens e  mulheres   na fonte primeira Nas suas cifras de acordes, dispõe os dedos, as mãos - nessas casas-carnes - a pingar notas que descem pelas coxas e tocam o prepúcio em   flor hirta A nota raiz encontra moradia alquímica de líquidos-sons-fragrâncias tônicas, diminutos... Em minutos... acordes aumentados, inflados, graves,  vibrações flutuantes Corpo elétrico, espasmódico em    gozo samba, blues, afroreggae Regue a boca, com o beijo encontre os sonetos de Neruda  e siga até Aletenjo Retome esse coração  em percussão   as mão, os dedos, a língua,  o cheiro ... teclas brancas, pretas lambidas, ressuscitam Mozart sinfonias  dizem  que a vida  (não) tem conc(s)erto! Então cabe a púbis (rasuras, ranhuras) - arteira! – principiar o triangular de pernas, braços com a pop art

UM POEMA DE LOURENÇA LOU

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  CINTILAÇÕES existe em mim alguém que grita insanidades na noite  carrega pó de chuva imagina acredita em outro amanhã um alguém a olhar vida de viés deserto eco espantos lamas lâminas  ventania além das montanhas a cantarolar  lead me to your door existe em mim um corpo cubista a cintilar e a se esconder em torno do sujeito amar.

UM POEMA DE DIRCE CARNEIRO

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  A PELE QUE HABITO Invólucro da matéria  embrulha meus ossos  músculos, nervos a carne do ser A pele que me habita poros do mundo  absorve a matéria  em todos os sentidos dias cheios de opostos A pele que me habita envolve tempos Incertos

UM POEMA DE ANDREA MORAES

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  FIM DE LINHA   Seca, lânguida Como irás?   Destrinchada. Nos laços. Numa demora de cordas. Como irás?   No carrossel, no caule em secreção, em aguardente. Como te represar?   Achatada, Alisando a grama ou amarga, cuspindo. Vida, como me deixarás?

UM POEMA DE DANIELA PACE DEVISATE

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  GRAÇA de madrugada visitei a morada mística do Amor e voltei vestida com o traje  carmesim  dos apaixonados por Deus

UM POEMA DE LOURENÇA LOU

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    FLOR ENVELHERCIDA A FERRO alguma coisa acontece nos primeiros dias do ano   indisciplinada expectativa abre janelas do sol cinzas dor ardume transitam pelas vias aéreas tristezas infindam horas minutos segundos   rock’n roll da legião grita que país é este   na memória chovem cristais dias a acordar melodias hoje vinte tantos picaretas despertam o palácio central café da manhã com gosto de flor envelhecida a ferro   renato continua a gritar e o país a morrer e matar.  

UM POEMA DE JORGE AMÂNCIO

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  A PEDRA SANGRA NA FLORESTA   a mata arde estalos o rio abriga jiboias   cabeça de cobra assovia bebe água   olha o mar banhar o sol! veja o mar doar peixes!   o bem-te-vi cospe flores a lesma listrada caga verde   mira no ontem acerta o amanhã   as folhas rosam o jardim futuros frutos da anamnésia   olha a terra esconder o sol! veja a terra emoldurar o mar!   na pele de uma formiga assoa o nariz   vai com a peneira comprar azeite no mercado  

UM POEMA DE EWALDO SCHLEDER

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  DÍVIDA NO EPITÁFIO   Ah quando eu me dizia ‘devo e não nego’   hoje me cobro por também não ter me dito ‘pago quando puder’     Se hoje digo     ‘nada me cobro’          é porque eu nada me devia   e se não mais me cobro é porque mesmo nada me devo – e estamos conversados – ‘acertei minhas contas’   adeus!  

UM POEMA DE PAOLA SCHROEDER

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  PANTEÃO DE NUVENS Suplico, porque minhas forças não veem um caminho. Não fale nada do teu mundo, da tua vida. Minhas dores rolam em tuas tentativas, pois sei que só tenho espaço quando tu silencias. Meu movimento é vasto quando busco finezas. O querer fere os sonhos que teu corpo incita. Que faço dos espaços vazios que nessa altura já são abismos? Não dividimos o ar, teu olhar não me alcança. Quebrei aquele valioso vaso em que Eros vivia. Sabes que não foi de propósito,  o desejo me deixa perdida. Teus dedos desenham uma face que ainda não apreendi. Não quero que feche os olhos se meu toque te desperta. Com sorte volto a te encontrar entre silêncios. Tuas mãos em movimento como se abraçassem pássaros. Tua delicadeza não te afasta de mim.  Meu desejo não me afasta de ti. Mas quando eu me chamar saudade, se despeça.  Deixe ir o carinho que te abraçou um dia.

UM POEMA DE LUCIANA BARRETO

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  BRUMADINHO Neste abraço de lama de dor mais mortos estendem os braços mais homens de rosto calcinado estouram suas veias de minérios     de calos Neste abraço de lama de dor gigantes do níquel do ferro deitam suas quilhas cruéis     obscenas sobre mil mãos em súplica sobre mil olhos vidrados Neste abraço de lama de dor mais vidas somam ruínas e sumimos mais um pouco – vexados miseráveis miúdos Neste abraço de lama de dor até o pranto emerge seco até o grito avança pra dentro e nenhum deus se faz morada

UM POEMA DE JOSÉ COUTO

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  UÁGI para a poeta Jade Luísa                       I na luz esverdeada do ofó as almas fundiram-se no batuque da linguagem entendi o perfume exalada da poesia e aspirei iá mi oxorongá        II no avesso da pedra esverdeada estava escrito aiabá em aramaico entendi o azul turquesa do córrego o vermelho da pitanga no chão batido a intrincada  trilha da água o abismo no fundo da mata e cantarolei ajé paó orum nanã   III no inverso do anverso do sopro odu lançou dezesseis búzios o babalaô de ifá tatuou na pele o olho esquerdo da lua girando as oito metades do opelê IV guerreiro oxóssi proteja com seu arco e flecha a poeta oriqui ela dança descalça na relva reinventando caminhos ampliando horizontes   minha mãe  iemanjá lave a ori da poeta oriqui com água cheirosa ela carrega seus ancestrais na raiz dos cílios no urucum debaixo das unhas nos cortes das solas dos pés    meu pai ossaim macere o alecrim a

UM POEMA DE ANDRÉA MORAES

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  CLARÕES   Construindo os pequenos degraus do meu corpo terra. Clamo por espaço!   Opaca antes revestida de goma meu corpo tosco se perfazendo. Clamo por espaço!   Terra erigindo cauda, peito sem cordas de sentimento Clamo por espaço!   Reconhecida me procuro rápida nos teus clarões. Clamo por espaço!