TRÊS POEMAS DE JORGE AMÃNCIO

 


VÊNUS NEGRA


na rua da mulher sem cabeça

a cabeleira

afro-caribenha

mistério erótico

na tela de Manet 


o mar a deixou em Paris

beleza crespa sensual 

amante das amantes

palco cor e estigma 


a mulher do dândi 

assistia às prostitutas 

de nossa senhora 


lorettes expatriadas 

futuras mães 

da belle-époque 


a beleza da pele 

agrava a nobreza 


o poeta e a atriz 

cristalizam o ódio


o perfume exótico

 na cabeleira 

uma serpente 

que dança na varanda


onde nasceu? 

quando morreu? 

onde foi enterrada?


outro dia caminhava

na rua da senhora sem cabeça

para buscar o amante poeta 

corroído pelo ópio e haxixe

com as flores do mal 

numa das mãos


DIVAGAÇÕES COM LEMINSKI


quando a fome 

for passado 

tudo o que se diga

será poesia  



quando o amor 

perder os gêneros

e a moral 

ceder ao desejo


quando houver

 a consciência

de que todos somos 

tudo


então cada palavra 

por ser palavra dita 

será  poesia


viver será poesia

pensar será poesia 

morrer 

continuará sendo 

a última poesia

nesse dia 

tudo que se diga

será poesia  


FELINO


paciente bote da espera

o gato caça 


de condutor a conduzido

silenciosa precisão 


vaga-lumes desordenados 

salpicam estrelas


planetas errantes

viajantes sem órbitas


pássaro abduzido

memórias e moelas


nave ultraterrestre

anos-luz escuridão


emplumado desfila

o gato acossa

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