QUATRO POEMAS DE SIDNEI OLÍVIO

 










MAQUINARIA

 

1

sentidos apurados

na forja móvel do mundo

 

explodem

num êxtase silencioso.

 

obsessivo desejo

de se permitir diferente

 

que só aos bardos

é dado ouvir

 

o crepitar dos versos

em aço.

 

2

sonoro é o fogo

em cada chama

 

um sussurro

entre a palavra dura e o assombro.

 

não há como fugir

da tensão entre os polos

 

fino efeito

que não se quebra em fio.

 

3

a mudez da imagem 

feito pergunta

 

(: o traço das cicatrizes?)

viver é copiar o instante

 

com a delicadeza da borboleta

sobre a flor.

 

 

FALTA UMA LETRA APENAS PARA DESVENDAR TEU NOME

 

Nenhuma resposta, apenas a imagem

da cordilheira coberta de neve

sobre o fundo azul impressionista,

e a citação empírica do trajeto

 

da escalada: um branco típico

na cabeça do Aconcágua,

com destinos solitários

e íntegra paisagem de pedras

 

e capins. Postal sem remetente,

tuas palavras denunciaram

o medo de se perder esquecida

na planície abandonada

 

ou entre os fantasmas alpinistas

de almas condenadas ao frio.

Eu aqui continuo intraduzível

e perpasso a encruzilhada

 

como quem salta estações

à vertente mágica das flores.

Devo confessar, teu perfume

mistura-se ao infindável silêncio,

 

desde a noite de ontem e o dia

ressurgido feito rascunho

de poema, verso a verso, a colar

no chão o vaso em pedaços.

 

CENAS AO AR LIVRE

 

1

ficou o verde de teus olhos

sobre o Caminho no Prado

em Pourville

o vesgo na parede do museu

quando ilícitas ergueram suas impressões

de resto renascidas

nas bocas de todas as línguas

nas mãos de leves traços de óleo

(gramíneas avermelhadas do passeio)

e na longa miragem da praia

onde pesam rastros sobre areia

 

 

2

não decifre a paisagem

com olhos concretos

a ótica da palavra é duro percurso

esquina que se dobra sobre a tela

dela estende o vazio à feição do nada

onde brotam imagens em cenas

a tarde que adia o escuro

aprenda a observá-la na hora mais tênue

quando cada pincelada sobre o branco

guarda além do gesto a linguagem oculta

 

 

MAL SÚBITO

 

obter sentença de morte

é morrer duplamente

 

mister subjugar o instante

à sombra do desenlace:

 

acaso de roletas

equilíbrio à beira do abismo

 

ocaso do herói caído

sobre a própria espada

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