CINCO POEMAS DE NILTON CERQUEIRA

 










CANTO À MARGEM

 

I

 

há milagre aqui?

poeta canta

ainda anônima

incrédula pergunta

 

II

 

escrita avulsa

derrama na página

improvável elemento

ateia fogo-fátuo

à nau repleta

de saber à proa

 

III

 

manche d'alma

de mãos dadas

à apreensão do mundo

universo pensado

avesso a manchas

repulsivo ao manco

 

IV

 

verdade sólida

translúcida

sujeita desmanchar-se

no ar

a olhos vistos

de viés

ouvidos revirados

céu estremece

diante do indômito

canto de Dante

 

V

 

também Camões

toma no tom

amor engenho

revolto mar

além vêm

americano

canto com Pound

compasso tenaz

ateia desmesura

traduz escombros

dispersos

 

VI

 

leme oculto

mistério maior

contado às voltas tantas

em fina dissonância

canto irrompe à margem

quando de repente incorpora

raspas vibrantes do ser

 

 

À ESPREITA DA ARTE

 

margem de tela

feita discreta isca

de risco

aguarda, pálida

sua captura

pelo rubro pigmento

presente

no gesto breve do artista


OSTRA


coleta

traste


encapa

crosta


extrai

traço 


labor

altera


opera

pérola 


luz

rara


BR 324

 

urubu

impávido

plana

ávido de sobras

da vida

quando

horrenda

estanca

 

ORAÇÃO PRA MÃE

 

ah, minha mãe,

menininha

(ouvirás ainda?)

vestida pequena

baiana na foto...

traga-me agora

verso que valha

onde há somente

soluço a soar

lágrimas de mim

 

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